sábado, 8 de dezembro de 2012

o que nos falta



oro pelo que me falta
que me constrói
ferida  que dói
como boca
como abraço
como teu lugar mais quente...

do silêncio
escutando teu silêncio.
oro pelo que nos une,
na nudez,
na prece,
no encaixe,
na resposta de todas as coisas.
doce e amargo,
comunhão de pele
em brasa,
em tremor,
em distância.
perdoa-me a repetição.
mas amar é repetitivo.
é fogo, 
ferro,
brasa.

o que dói em nossas feridas
não é o pedaço que nos falta,
mas a  espera da cicatriz.

domingo, 25 de novembro de 2012

domingo, 25/11/12, 12:58

Estava saindo do prédio da Mecânica na USP, tinha levado minha filha pra fazer a FUVEST quando os dois candidatos aparecem esbaforidos. estavam no lugar errado. o lugar certo era a FEA e saem correndo de novo. olho no celular e faltam 2 minutos. nem Usain Bolt consegue chegar lá em 2 minutos. corro para o carro e consigo alcancá-los. buzino e peço para entrarem no carro. entram sem tempo para apresentações. só lembro de comentarem que numa hora dessas é bom nem perguntar. nunca corri tanto e depois de duas contramãos deixo os dois na porta da FEA. só deu tempo de ver os flashes de longe e a porta se fechando atrás deles. fotógrafos registrando a agonia dos atrasados. o coração disparado. missão cumprida. à noite encontro a foto dos dois na internet. espero que tenham ido bem.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

madeira



, e assim, dou forma a madeira, obedeço teus veios com meus dedos ásperos. a saliva e um prego triste, um ponto. que vira uma rachadura, lasca que se prolonga em meu peito. mas a madeira se transforma, em viga, sustento, arma, em fogo algum dia. me cubro de serragem e teu cheiro ancestral de caminho. o mesmo caminho em que te perco. para que tu te aches.

sábado, 10 de novembro de 2012

rascunho


coleciono kombis.
procuras por um pai. 

dilacero meu corpo sem descanso.
queres um espelho.

bebo vinho sem hora e sem culpa.
choras. 

espero pela morte sem medo. 
tens medo é da solidão.

quebro a casca. 
gostas da nudez.

fecho o círculo. 
tu também.

a  kombi era de meu pai. 
meu corpo não é mais meu. 
morte. 
solidão, 
tanto faz. 
o círculo se fechou.
filósofos de esquina e a  história de fechar o círculo. 
se não está fechado ainda não posso falar em círculo. 
nós só percebemos que estamos andando em círculos 
quando chegamos ao ponto de partida.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

os dias em pesadas páginas,
em meu corpo cansado,
esperando por tuas mãos.
bálsamo que me traz o sono,
o espanto, o encantamento.
meu corpo dolorido,
exaurido,
espera por tuas mãos,
agora e sempre.

domingo, 4 de novembro de 2012

; em sonhos, em verdes sonhos, cavalgas nua no que ainda resta de tarde. Assisto a fuga de teus cabelos avermelhados pelo sol, que resiste em cerrar os olhos. Conivente em sua disparada, deixo a lenha, a terra molhada, retalhos de chita. E vejo teu dorso, tuas espáduas firmes, desaparecerem no horizonte, até o próximo sonho, no que ainda resta de tarde...

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

tudo

, deixo minhas dores no vão das portas, na cabeceira silenciosa, nos bolsos vazios. Teus cabelos presos, teu ventre trêmulo, teus dentes acesos, tudo em frascos pequenos sem tampa. Tudo para não esquecer da dor e do perfume, esse hálito molhado que faz teimar a vida, e suas tantas mortes, nos canteiros, nos jardins secretos da memória.

sábado, 20 de outubro de 2012

self

, já não se importava com o rótulo, o ano, a uva. Prometeu e cumpriu: uma só taça. Queria lucidez para revirar o porão, abrir caixas, revirar todos os livros. Repetia sempre que todas as respostas estavam nos livros. Queria respostas, todos queriam. Não estava embriagado mas começou a rir sem parar com a descoberta. Passara a vida inteira atrás de respostas certas, mas só agora se deu conta de que eram as perguntas  que estavam erradas.

sábado, 13 de outubro de 2012

, teve que por os óculos para cortar as unhas. diferentes, caneladas, como as de sua mãe. notou no espelho que as bolsas sob os olhos também eram iguais ao de sua mãe  e os vincos no rosto, os sulcos arados pelo tempo, era mais um retrato de seu pai. saiu pelo corredor atrás de salsa e alecrim, na pequena horta num canto do terraço. a pitangueira estéril contemplava sua agonia e seu êxtase ao sentir o perfume das ervas , maceradas sob as unhas caneladas. chovia. silenciosamente chovia. foi assim, sob a chuva, que descobriu que as pessoas sofrem,gastam uma energia danada no muito que se tem a ganhar, e esquecem do pouco que tem a perder. do imenso valor do pouco que se tem a perder. e foi assim, com os óculos embaçados e a alma encharcada, que ele ganhou o dia.

domingo, 16 de setembro de 2012




A ALMA DO VINHO
                                  (Charles Baudelaire)

A alma do vinho assim cantava nas garrafas:
"Homem, ó deserdado amigo, eu te compus,
Nesta prisão de vidro e lacre em que me abafas,
Um cântico em que há só fraternidade e luz!

"Bem sei quanto custou, na colina incendida,
De causticante sol, de suor e de labor,
Para fazer minha alma e engendrar minha vida;
Mas eu não hei de ser ingrato e corruptor,

"Porque eu sinto um prazer imenso quando baixo
À goela do homem que já trabalhou demais,
E sei peito bastante é doce tumba que acho
Mais propícia ao prazer que as adegas glaciais.

"Não ouves retirar a domingueira toada
E esperanças chalrar em meu seio, febris?
Cotovelos na mesa a manga arregaçada,
Tu me hás de bendizer e tu serás feliz:

"Hei de acender-te da esposa embevecida;
A teu filho farei a força e a cor
E serei para tão terno atleta da vida
Como o oleo e os tendões enrija ao lutador.

"Sobre ti tombarei, vegetal ambrosia,
Grão precioso que lança o eterno semeador,
Para que enfim do nosso amor nasça a poesia
Que até Deus subirá como uma rara flor!"

La dernière goutte.mov

sábado, 25 de agosto de 2012




estico teus braços,
rédeas...
teu dorso -
arco perfeito -
nossos dedos costurados...
teus cabelos furiosos...
vértebra a vértebra,
de tua nuca
ao fundo do meu centro.
dividindo-nos...
mosaico escandaloso,
geometria de carne e agonia.
chicoteio tuas ancas
com meu desejo,
com minha ilusão,
com minha fúria adolescente.

sem pressa,
morro dentro de ti,
antes de nascer,
de descobrir...
antes de pedir
um beijo,
um esfomeado beijo...

...........................................................................................




quinta-feira, 23 de agosto de 2012


"...ships, ships,/
and other relationships,..."
(Hard Feelings, Paulo Leminski)


em inglês
o som da palavra
exata
martelando...

- relacionamentos -

barco escolhendo vento -
à deriva,
encalhado em bancos de areia.
as estrelas,
lágrimas pra cima.

ships
ships

somente estrelas
lágrimas para cima
sempre


sábado, 18 de agosto de 2012

Provocações - O Essencial é Saber Ver (Alberto Caeiro) - Abujamra - 14/0...

tuas espáduas nuas
em minhas mãos perdidas,
dispensando mapas,
bússolas.
estrelas coniventes
em teu rastro de saudade,
em teu sorriso -
constelação.
teus olhos em final de tarde...
preparo mantimentos
para estiagem,
abrigo de tempestade.
me refugio
nas entranhas da saudade,
do teu cheiro,
do teu gosto,
do sumo perpétuo
da descoberta.

terça-feira, 31 de julho de 2012

la petit mort!
em francês
em alto e bom som.
som de alma.
de quase morte.
de tantas ...
em teus braços...

sábado, 21 de julho de 2012

furos no céu...
diamantes que cortam
meus olhos.
nós desfeitos
no peito,
na pedra escura,
estranha criatura
que poda cabelos:
espelhos.
espículas nos pés,
sangue
de andarilho sem norte,
se alimentando da sorte
das rimas em vão.

furos no céu...
talvez sua boca...
aberta,
espreitando,
nosso silêncio
de sempre.

terça-feira, 17 de julho de 2012

meus pés
meu corpo
meus olhos
lentamente
desaparecem
sob a areia
sob a espuma
sob a chuva
no sofrimento
silencioso
da maré cheia.

sábado, 14 de julho de 2012

teus grandes olhos
chegam primeiro,
antes da noite,
do escuro,
de estrela em fuga...
teus grandes olhos
sonham em dizer,
em mínimas linhas,
o que sabemos de cor...
em cor e forma,
num longo suspiro de saudade.
brilhantes,
profundos...
teus grandes olhos...
indecifráveis,
mágicos,
eternos.

sábado, 16 de junho de 2012

perco-me na ilusão do teu abraço. ilusão definitiva que alimenta. seduz. embriaga.
perco-me todos os dias no mesmo caminho. sem atalhos. sem sombras. sem dúvidas.
perco-me no infinito de teus olhos. bússola  apontando para o sul dos nossos umbigos.
perco-me em lágrimas e risos sem roteiro. em histórias de dormir. em sonho.
perco-me sempre na pedra morro acima. nas feridas do dorso nu. na tempestade.
perco-me dentro de ti . dentro de nós. dentro.
sempre.

sábado, 9 de junho de 2012

periferia não é margem
é centro
de outra margem
do outro lado do rio
do outro lado da sorte
periferia não é centro
é destino
outra paragem
não é morte
é desafio.
é terreno baldio
batendo vidro
cola e cerol
bola de gude
pião
pipa na laje
periferia não é margem
miragem
de um outro centro
onde reina a coragem
de ser feliz.

"CRÔNICA DE UM AMOR LOUCO" CENA FINAL(PRAIA)

pêssego:
impossível deter
meus dentes
sem cheirá-lo,
sentir seu veludo,
até o suco escorrer
pela boca...
inebriando o ar
e meus sentidos,
perdidos,
no doce molhado
do teu gosto,
do teu cheiro:
relva molhada,
jasmins,
alfazemas...
tremendo no vento,
em meus braços,
na tua volúpia de fruta,
menina-flor.
esquecendo de nós,
de tantos e tantos nós.
num espasmo de calor
que não tem nome...
te vejo na primeira mordida,
no primeiro beijo,
no vinho que dorme
sob os espelhos,
sob teus grandes olhos!
o mundo girando
sob teus pés de cristal,
princesa que dorme
em garrafas,
bilhetes,
especiarias...
na perfeição de criatura
que habita o coração incauto,
da tempestade em meu peito,
silenciosamente sedutora
como pêssego maduro.


quinta-feira, 7 de junho de 2012

sei de ti todos os caminhos.
teus atalhos,
teus desvios,
teus abismos.
sei de dentro de ti
todos os sentidos,
que cabem num abraço,
no descer de pálpebra,
no escuro da partida,
no sorriso da chegada.
sei de ti quase tudo,
quase nada.
assim,
fragmentado,
sutil,
verdadeiro.

quinta-feira, 31 de maio de 2012

trinta e um

à procura de nós mesmos
cruzamos a cidade...
perdidos em nós mesmos...
o caminho de pétalas vermelhas
com gosto de abacaxi,
de figo maduro,
de beijos
e abraços furiosos...
como a penumbra da tarde,
como o gemido do vento,
a soprar no ouvido
dos corpos largados,
assustados...
e de nós mesmos,
lá de dentro,
fundo,
fundo,
cúmplices eternos
da força que emerge do sonho,
da saudade
e do encantamento.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

paixão, cena 2, tomada 17


a paixão que  consome
já teve nome,
dias de pura fome.
bateu ponto
no pronto socorro -
fadas e feridas -
escritas na areia,
na casca das árvores,
dormindo na cadeia,
nos lenços de papel.
cabelos na lua cheia,
abelhas tecendo mel.

a paixão que nos consome
não é fruto que se come
em plena flor -
é suco agridoce -
antes tarde fosse,
se quando acorda
anoitece.

a paixão que nos consome
é felicidade
bem debaixo do nosso nariz
- Casablanca
Último tango em Paris -
lágrimas tantas...
chuva...
na paisagem de giz.


segunda-feira, 21 de maio de 2012

ausência

Hei de edificar a vasta vida
que mesmo agora é teu espelho:
toda manhã hei de reconstruí-la.
Desde que te afastaste,
tantos lugares se tornaram inúteis
e sem sentido, como
luzes no dia.
Tardes que foram nicho de tua imagem,
músicas em que sempre me esperavas,
palavras daquele tempo,
eu terei de quebrá-las com minhas mãos.
Em que profundezas esconderei minha alma
para que não enxergue tua ausência
que como um sol terrível, sem ocaso,
brilha definitiva e impiedosa?
Tua ausência me cerca
como a corda o pescoço.
O mar em que naufraga.

                                    (Jorge Luis Borges, 1923)

sábado, 19 de maio de 2012

carta de navegação

o relógio pára no exato momento da partida. uma revoada de pétalas e pássaros vermelhos assusta o dia que se deita em silêncio. o relógio agora registra, duas vezes por dia, como um veredito, uma incógnita, a certeza, a verdade, a dor suprema que encanta os homens e enlouquece andarilhos sem bagagem. sob os ponteiros paralisados o sangue teima em pulsar até o próximo corte, o derradeiro, o inevitável. esvazio bolsos e a alma atrás de respostas. mas o que queima no peito não tem nome, nem endereço. o que queima no peito atende por todo o dicionário de sentidos, inéditos, indecifráveis. se desperto as madrugadas com teu gosto na boca, o teu cheiro, não é desespero, é alegria. uma alegria de lámina que rasga e  percorre o peito, como o primeiro toque, o primeiro cheiro dos teus flancos, da tua entrega plena , em mil imagens, em mil  afagos  e gemidos.  e  invado o jardim de mãos nuas, revolvo a terra, lágrimas antes de sol. arco-íris talvez. e acordo pro vento, esticando velas, respirando o dia e  a saudade. a saudade no horizonte dos teus olhos.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

pesco na memória
a cantilena
das meninas
no rio...
batendo roupa nas pedras,
soprando  lenha,
passatempo de frestas,
fumaça
e vestidos de chita.
as meninas sonhando
no barulho da espuma.
castelos e fortalezas.
beijos e abraços demorados.
forasteiros.
alho e cebola
frigindo...
sinfonia
esperando a noite

domingo, 6 de maio de 2012

sacrifício

acorrento tempestades,
despeço-me da saudade
que estremece na nadrugada
silenciosa...
em círculos,
catalogo vinhos e flores
em Paris,
na paisagem da parede,
nos quatro cantos do mundo...
das chagas em minhas mãos,
em meu peito grisalho,
nas têmporas,
no esquecimento...
entrego-me ao sonho
dos teus sinais particulares,
nas roupas jogadas,
na tua boca marcada
em copos,
em minha boca,
no abraço furioso
das tardes de outono.

costelinha assada com batatas ao iogurte com damascos

ingredientes:
1,5 kg de costelinha suína com bastante carne
400 ml de vinho branco
4 colheres (sopa) de sal
400 ml de água
pimenta  do reino
ervas secas (pode ser herbs de provence ou
cheiro verde a vontade)
3 colheres de melado de cana ou rapadura moída
ou mel
molho:
5 damascos secos
2 colheres (sopa) vinho do porto
100 ml de iogurte natural
batatas:
3 batatas médias cozidas
50 g de manteiga com sal
salsa desidratada
alecrim
preparo:
faça uma marinada com o vinho, o melado, a água, o sal
e os temperos e deixe a peça imersa por 12 hs na geladeira
com a parte dos ossos virada pra cima. no dia seguinte
coloque numa assadeira juntamente com a marinada e leve
ao forno por uma hora coberta com papel alumínio. corte as batatas
cozidas em pedaços pequenos e passe na manteiga derretida junto
com as ervas desidratadas. tire o papel alumínio da forma e coloque
as batatas e deixe mais meia hora no forno para dourar. se preferir
pode pincelar a peça com mel para que fique mais dourada.
enquanto isso faça o molho cortando os damascos em lascas bem finas;
coloque numa panela juntamente com o vinho durante 5 minutos e depois
de frio incorpore o iogurte. sirva com arroz branco e um cabernet sauvignon
de sua preferência. em dias quentes, um branco chardonnay é boa pedida!

sábado, 5 de maio de 2012

Lia e Raquel

por sete anos cuidarei do rebanho.
por sete anos serei servo do silêncio.
esculpirei  o destino na pedra,
no pão,
no vinho sob meus pés.
por sete anos esperarei pelo sorriso
que abre todas as portas.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Poema da página 112 - E. E. Cumming

de olhos fechados,
encontro o mar:
cegueira sem palavras,
cartas náuticas
na fúria do silêncio.
há musgo sob meus dedos,
nas frestas
sob meus braços,
abraços esculpidos
em sal
e saudade.

quando a cegueira
bate traiçoeira,
teu cheiro me guia
no precipício,
na neblina que se funde
ao mar,
aos teus fundos olhos,
aos mortos sem perdão,
sem promessas,
sem escuridão.
meu edifício treme,
e a garganta seca
de náufrago
é só uma promessa de beijo,
de abraço, de escravidão.
e acorrentado,  quebro pedras,
planto os dias, esqueço a fome.
a fome que move todas as coisas.
a fome do teu nome
em meus lábios.


sexta-feira, 6 de abril de 2012

caminhante

bebo do cristalino desse espelho
e seu reflexo é toda minha intuição
em feixes de trapos e reminiscências.
escolhi um desvio na floresta,
mas não me perdi como pensam,
só demorei para chegar ao destino.
só demorei para achar o que nunca se escondeu.
que quando a gente sente não é fuga,
é instante. é pedra. é fogo.
e é perpétuo.
só não são perpétuos os desvios que a gente não segue.
porque quem escolhe vive.
quem escolhe é livre.
e ao contrário, morre quem se alimenta
da história do outro caminho
que nunca mais vamos trilhar.

subterrânea

da Liberdade
ao Paraíso
são só três estações.

domingo, 4 de março de 2012

teus dentes
rasgam minhas espáduas,
terreno de vincos,
sepultura de unhas e sustos.
rodamoinhos no centro
de tua barriga inquieta.
dedos,
calcanhares,
estátua assombrada
de mármore
e fruta mordida.
pés,
pernas,
ponteiros de história inacabada,
invadindo a escuridão
de suor e flores sem nome.
em minhas mãos
teu grito é insano
como um dicionário.
como lições de álgebra
e de tempestades.


teus dentes se despedem
na vertigem pueril da primeira queda,
do primeiro espanto de liberdade.
no veludo de teus ombros
cabelos em partitura...
e da indecisão de nossas pernas,
quase um ramalhete de gérberas,
réquiem de lágrimas perfumadas.

'Estilo' - Charles Bukowski

quinta-feira, 1 de março de 2012

simetria

meu abraço -
trapézio -
teus braços
paralelos...
o redondo perfeito
dos teus peitos.
dentro do redondo dentro,
o círculo perfeito,
mamilos em fúria.
pernas,
coxas,
ângulos retos...
umbigos
procurando centro.
- movimentos
uniformemente
variados -
do meu eixo perdido,
nalgum canto escuro.

teu abraço,
nossas pernas,
bissetriz.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

passagem

esqueço minhas mãos no fogo,
no vão de portas,
na úmida espera
de tuas coxas crepitando sonho.
no precipício de teus olhos,
brasas imolando nossos corpos,
embalsamados na tragédia.

e das cinzas faço jardim, festa
de  sentidos e despedidas.
faço trilhas de caracóis,
faço alecrim em tua nuca,
em teus flancos, entre dedos...
quase um nectar,
escorrendo,
de nossos corpos misturados
e esquecidos...

domingo, 19 de fevereiro de 2012

"Imagino a delicadeza. A subtileza.
O toque quase áereo, quase
aereamente brutal.
Ser tocado pelas vozes como ser ferido
pelos dedos, pelos rudes cravos
da planície.
Ser acordado, acordado.
porque cantar é um subterrâneo.
Depois é um pátio.
Imagino que as vozes são escadas.
vozes para atingir um canto.
O canto é meu corpo purificado."
                                            (Herberto Helder, Poemacto)

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

bukowskiano

quem me dera
envelhecer safadamente
invadindo decotes
transparências
caçando palavras
na máquina de escrever

possuindo mulheres sem nome
bebendo vinhos sem nome
devendo aluguel
em quartos
de duvidosa reputação.

quem me dera
envelhecer safadamente
largado na vida,
embriagado,
embalado nos chiados
dos discos de vinil.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Herberto Helder - Via INIMIGO RUMOR

Nieto Senetiner Syrah 2008

não não vou falar de elocubrações olfativas,
gustativas e sei lá o quê.
nem tampouco da amnésia do dia seguinte.
falo do prazer de tê-lo ao meu lado
desinteressado
companheiro
conivente
entorpecendo a alma
sem procurar respostas
só perguntas certas
veias abertas
fraturas expostas

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012


os 5 estágios da morte (da paixão)
segundo Elisabeth Kubler-Ross

negação
raiva
barganha
depressão
aceitação

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

astrologia

no ano em que nasci
Hilda Hilst foi morar
na Casa do Sol

bossa nova (pra cantar feito João Gilberto)

ponho o meu pé no corredor...
mas, você, já longe,
quanta dor...
e no peito
a ferida
que o tempo não secou.
o tempo que você pediu,
o temporal que desabou...
já faz tempo...

ponho o meu pé no corredor...
mas você, já longe,
quanta dor...
e no peito
a ferida
que o tempo não secou...
já faz tempo...

                            (19/04/1992)

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Charles Bukowski - Bluebird (Legendado PT-BR)

sem título

recomponho
nas linhas,
nas curvas,
nos desfiladeiros,
no sangue tinto
dos teus olhos, 
a exata distância, 
do canto
dos pássaros,
que, engaiolados,
vigiam a liberdade.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

não importa o fuso horário.
a viagem começa onde tudo termina.
abra o vinho.
abra as gavetas.
pode ser
que você encontre
o inimaginável.
sempre.

Vidas Secas Reloaded - argumento

"Eu te amo, porra!". era difícil não ouvir, ali do lado, na praça. no Paraíso. ELE puxou-a pelos ombros. ELA se desvencilhando. Ele repetiu com a voz trôpega, espessa, as sílabas tortas como seus passos. "Eu te amo, porra!" Os dois ali na praça, mal se mantendo em pé. A carroça, esqueleto do que foi um dia uma geladeira, encostada, cheia de papelão, quinquilharias,carcaças, vasilhames inertes. os filhos brincando perto, descalços, barrigudos. Amarrado à carroça, o cachorro assiste a tudo, impassível, com uma corda improvisada no pescoço. Sentado nas patas traseiras, parece que cochila. Não era a primeira vez que presenciava uma discussão de relação. Solidário. Conivente. ELE com o rosto vermelho, inchado, a pele coberta com aquela casca de fuligem negra da cidade, cicatriz no supercílio, vasto repertório de brigas e idas ao pronto socorro. A boca mole de alguns dentes. ELA na mesma cor e indulgência., no mesmo inchaço, os peitos murchos, uma cicatriz tosca no braço, o vestido sem esquadro que lhe serve de moldura. Inevitável a compração com Fabiano e sua troupe. Só lhes falta o papagaio. Se atracam a céu aberto, diante da indiferença de pernas e buzinas. declarações de amor de tempo incerto. Não há passado nem futuro que os consolem. Só a embriaguez do presente indecifrável. Com que sonham? Dormem? Uma cama macia? Um pasto verde com cabras? Fazem amor sob os papelões? Amanhã ELE dá um jeito nos policiais que andam enxotando a família. Nos vagabundos que aprontam de madrugada. ELE diz que a ama, e é a única verdade sob o céu que escurece. Os trovões silenciam suas palavras. Sob as árvores se juntam feitos bichos. Sob a tempestade, o silêncio. E quando chega a madrugada, ainda restando um naco de consciência, tal qual Fabiano, engole seco seus pensamentos: "Eu sou um bicho!. Um bicho!". O mundo continua a girar na cidade iluminada, nas redes sociais, nas rotativas dos jornais e na solidão da praça.

Nieto Senetiner - Pinot Noir - 2010

Descubro este argentino com alegria. Afinal, os amigos Sergio Müller e Cristiane
me presentearam com a 'bodega' inteira. sem falar nos complementos que vieram
de lambuja: 1 kg de farinha e batatas asterix. Só falta combinarmos o Nhoque.
Vinho leve, sem sobressaltos, tanino leve, notas de saudade e histórias pra contar.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

sinestesia


sugo
de teus grandes lábios,
taninos fortes,
sábios,
anestésicos...
frenesi
de papilas
e papiros...

framboesa,
cardamono,
terra molhada,
brincos de princesa,
gatos no cio.

catalogo
rolhas, rótulos,
no cofre da memória.
junto com teu cheiro,
tua língua,
teus grandes lábios furiosos,
teu suor de vinho maduro,
nalgum canto escuro...
que envelhece,
que mofa,
que fenece,
como tem que ser...
vindima inesquecível.

sábado, 28 de janeiro de 2012

retrogosto

harmonizo teu desejo,
tua fúria,
tua busca,
com um tinto.
[safra desconhecida]
madeira,
capim molhado,
pétalas secas.

decantado
no escuro
de vários silêncios.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

besteirol



se vem com três pedras na mão
faça um canteiro.

se vai rodar a baiana
espere o carnaval passar.

se vai chutar o pau da barraca
espere chover primeiro.




percurso

o vinho contra a luz me diz que tudo está escrito e os incautos, como nós, em folhetins diários. roteiro mal acabado de escritor fracassado.[ Bandini]. e seguimos na tentativa de mudar o final da história. haverá final? o jogo da amarelinha tem lá seus mistérios.[ Cortázar]. tudo se resume ao primeiro contato. ao primeiro gole de oxigênio, o primeiro olhar, o primeiro passo, depois o tombo, o abraço, a paixão, o amor. a primeira descarga de adrenalina no peito e seu calor de mil bombas atômicas. continuamos buscando. e como tudo se resume ao mesmo círculo, o dilema mortal é: corremos atrás ou esperamos tudo passar aqui de novo? como se esse fogo que perseguimos fosse ônibus sem itinerário, a cura num remédio sem bula. tudo condensado no primeiro olhar, na primeira conjunção deste planeta com aquele. sinfonia cósmica que coube num abraço, olho no olho, num beijo esfomeado. sem beijos esfomeados a humanidade não anda. seguimos enganando o autor arrancando páginas, rasurando finais de capítulo, na vã ilusão de conforto. esquecemos que esta parte do roteiro já passou há exatos segundos atrás. incompletos seguimos. insatisfeitos, alimentados de projetos imperfeitos. como quem busca um beijo esfomeado, como quem busca o calor de mil bombas atômicas. como da primeira vez. e como será sempre.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

"só uso a palavra para compor meus silêncios"


(Manoel de Barros)

Provocações: Abujamra declama Mário Quintana

tuas mãos se abrem...
regendo orquestra de chuva
ou será de lágrimas?

envolvem teu destino
num abraço conhecido,
esquecido,
mas quente,
conivente...

tuas mãos apontam o caminho
ou será uma faísca de sol
refletida nos olhos
do desconhecido?

tanto faz
se é chuva,
lágrima
ou sol...

tanto faz se escolhemos
ou somos escolhidos...

o que faz sentido
ainda não faz parte da gente...

sábado, 21 de janeiro de 2012

florais de baco

vinho & poesia

uma coisa leva à outra.
rubras e rubis
uma taça inesquecível
religiosamente,
festivamente,
bacantemente.
depois da segunda taça
tudo é poesia
cantada,
declamada,
rascunhada no guardanapo.
evoé Baco!
salve os princípios terapêuticos
dos florais de Baco!

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

bebo do teu vinho - parte 3

sobriamente percebo:
és como vinho!
cada encontro
uma colheita.
misteriosa vindima ,
sutis fragrâncias ,
toques amadeirados ,
frutas vermelhas.

teu corpo exalando
inominados bouquets...
em cada gole.
pés descalços,
fermentações,
aromas febris,
línguas castigadas,
pelo retrogosto da saudade.

branco ou tinto,
dependes de sol...
hormônios em fúria,
dependes de chuva...


sob a luz,
decanto-te lenta...
fugaz,
sorvo-te sem pressa
até a embriaguez.

sabores agridoces,
tua boca tem o martírio
de todas as castas,
de todas as mãos castigadas
pela comunhão das uvas.


e nossa paixão,
taninos em luxúria,
envelhecerá
em leito de carvalho...

até a próxima taça.

nosso amor é árdua colheita

nosso amor é árdua colheita. semeamos inseguros toda sorte de terra. inseguros dia a dia a acreditar que vingue. que brote. que floresça. e quando estamos seguros do amor, do amor verdadeiro, que nos alimenta, que nos traduz, vem a tempestade, ventanias de setembro, a levar tudo embora. e de novo inseguros cortamos a terra. salivamos por chuva e sol. retomamos a lida dos incautos pelo coração derramado em semente. não há triste sina que não floresça. nem abraços. nem saudades. me descubro lavrador, com as mãos empipocadas, grossas feito um adeus, feito cachorro sem dono. feito silêncio. lavro a alma incendiada do passado de ontem como quem morde um pêssego. de néctar e lágrimas. sentindo sua pele, tuas veias no colo nu, seu gosto em minha boca de espanto. vigiando a doce espera. insegura como deve ser , mas cruel, árida e soberana. é preciso guardar as ferramentas no porão , embrulhadas nos lençóis de nós dois, da nossa loucura silenciosa e de fúria, como dois lavradores à espera do calendário. quem sabe na próxima virada da lua haverá certeza nas estantes da sala? e te amarei sem pressa, alucinadamente sem pressa, sem medo de perder a colheita. árdua colheita.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

sobre uvas e paixões

se as paixões não tem futuro,
vivo seja o presente.
não há uva
que saiba do seu gosto
até sentir a saliva quente,
que mortalmente a invade,
sentindo o gozo de seu nectar.

se as paixões não tem futuro,
vivo seja o presente.
não há uva que saiba do seu poder
até ser macerada, no fermento do tempo,
guardando sua essência para os amantes do vinho.

se as paixões não tem futuro,
o presente vive em mim.
em cada beijo, uva mordida,
em cada vinho, página lida,
corações feridos à espreita:
vigiando o sabor
da próxima colheita.

bebo do teu vinho II

o vinho desperta o mais profundo sentimento. não por acaso, talvez seja a bebida mais simbólica em contato com o ser humano. desnecessário alinhavar sua história ao longo dos séculos. antes mesmo da uva o vinho já nasce com a intenção. em qualquer canto do planeta, alguém se dispõe a cultivar o seu sonho de uva. sem a primitiva intenção do vinho, se em nossa alma estiver o silêncio da intenção. não sei quem primeiro a transformou na bebida que conhecemos hoje. talvez a epifania do primeiro gole, do aroma, da embriaguez, tenha elevado o homem à categoria do sagrado. o fato é que o vinho existe, de diversas origens, de diversas formas de se fazer, de se consumir, de se embriagar. não vou falar de simbolismo. a imensa simbologia cabe a cada um que o degusta. mas falamos de castas, de climas, de ocasiões, de aroma de frutas, de clima, e de sentimento. o mesmo sentimento que eleva o ser humano à categoria dos iniciados. o vinho, se corretamente apreciado, eleva a alma do bebedor à categoria de amador, no sentido amoroso da palavra. estilhaça os sentidos e nos faz elevar o espírito, antes da costumeira embriaguez. aguça os sentidos, como quem aponta um lápis, ou tira a roupa de uma mulher, ou de um homem. mas há que perceber sua alma e seu encanto. o vinho pede um ritual. outro dia, na praia, vi uma senhora pedir um copo de vinho. num quiosque. um copo americano até a boca, com vários cubos de gelo. não é desse vinho que estou falando. falamos do clima e da imensidão de sentidos, por trás deste simples ato de cheirá-lo, olhá-lo e degustá-lo. deus me livre desta imensa verborragia, mas é necessária. quer detestar tomar vinho? vá ao supermercado, namore os vários rótulos, escolha um, coloque no carrinho e siga. chacoalhando no carrinho, chacoalhando no porta-malas, finalmente chegue em casa, abra-o e tome. vai ser a pior experiência de sua vida. todo o processo, desde a intenção do homem em cultivar a sua uva, até o fundo do copo, cairão por terra, feito um meteoro desgovernado. não, não é assim! é o mesmo que paquerar alguém, sequestra´-la, enfiá-la no porta-malas, chegar em casa e sonhar que vai fazer amor com ela de maneira inesquecível. não. o vinho merece apreciação, namoro, identidade, descanso, longe da luz e do calor. beber do bom vinho é fazer amor com quem você mais ama, lenta e sem pressa, como diz a cartilha dos bons amadores, e por que não dizer, amantes.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

não saiu no raio x o que sinto.minto por um remédio controlado.deste lado do cérebro havia uma suspeita.dispensei passar de mão na cabeça e condolências de ocasião. no lixo procuravam por pistas do meu destino. ontem quase não me escapuliu a alma como de costume.estanquei lágrimas.congelei sorrisos. vigiava a madrugada esperando sol. nu, me cobria de lembranças. a boca seca engolia teus gemidos. nossa loucura me alimentava todo santo dia. segui coberto de lembranças e desespero. lembranças e desespero não saem no raio x.

Escolha de um Amigo - Programa Provocações Antônio Abujamra

bebo de teu vinho

bebo de teu vinho, e é tarde. e é a imensa tarde que flutua sob nossos corpos: cadafalsos, precipícios, cais de porto. do teu vinho decanto especiarias, trêmulas notas florais, sedutores frutos maduros. teu vinho, frasco esquecido nalgum escaninho, maldição cíclica dos amantes sem endereço: cegueira, analgesia, vertigem. e o espelho é só um relógio sem ponteiros. bebendo do teu vinho. grudados feito cães de rua. tarde rubra como o fundo de nossas almas misturadas. bebo toda a colheita sem pressa. a tarde levedando beijos e choques elétricos. bebo de teu vinho...

terça-feira, 17 de janeiro de 2012


paixões


enterradas vivas


germinam...


brotam...


e costumam


florescer silenciosas


na primavera..

sem trégua


sovado


até o esgotamento


massa descansando


fermentando


gavetas, livros,


qualquer lugar


que vigie


o esquecimento


levedando...


como quem puxa uma rede,


caça uma borboleta,


a bateia na areia do rio...


a massa crescida


arestas cortadas


vírgulas


estranhamentos


como quem corta cabelos


tosquia ovelhas


poda arbustos


forno


para isso


existem crepúsculos


noites de lua cheia


paixões desenfreadas


de línguas perdidas


despedidas


para repartir esse pão


é preciso ter fome


sempre

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

vernissage

os visitantes nos contemplam nas estátuas,
estamos fazendo amor,
em diferentes tempos,
vestes e sonhos.
nos quadros,
a luz do teu sorriso
compõe-se de estrada e desafio.
estamos nos corredores,
largados,
exaustos,
acordados do sono de ontem,
dos corpos em
furiosa luta,
de suor, saliva e sonho.
os visitantes fecham os olhos
para a paixão destruidora dos novatos.
todos querem o palpável,
o cristalino,
o que faz sentido.
não encontrarão
aqui nada que seja explicação:
somente as paredes
coniventes
do amor sem
tempo nem espaço.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

teus olhos

colecionamos tempestades:
lágrimas, silêncios, desejos.
no peito de âncoras,
tua voz de ninfa ,
despedaça a vertigem
dentro de nós...
colecionamos prazeres
de mel e espuma,
especiarias...
saudade do que é presente
e que habita o nosso sonho
de sempre...
procuro nos mapas,
nos diários,
um pedaço do céu
que nos guie,
que nos transforme
em algo mais leve
do que uma tempestade
quando rompem trovões
dentro de nós...
dentro de teus olhos...
incandescentes...
inexplicáveis...
lindos.
inexplicavelmente lindos.