terça-feira, 11 de novembro de 2014

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

ainda sobre dragões




Não sei ainda se tenho dragões  em meu peito. Uso o plural porque é difícil precisar se são vários ou se é apenas um com múltipla personalidade. Só sei que a convivência e o respeito são insuficientes para compreendê-lo ou compreendê-los. Mais difícil ainda é acreditar que está ou estão comigo. Ou se viajo demais e a sua existência por mais tênue e louca que possa parecer é álibi conveniente para meus atos e faltas. Para as intempestivas palavras em brasa rompendo das ventas em momentos de fúria e pouco discernimento. Em noites em claro. Em palpitações crescentes. Uma paralisia mental que extenua. Tenho um dragão sim em meu peito, numa certeza cambaleante. E essa azia constante, esse fogo que sobe pela garganta, não há gastroenterologista que diagnostique. O calor que me acorda no meio da noite não sai nos laudos de endoscopia. O fogo está onde sempre esteve. Só agora entendo das escaramuças da  guerra  em curso. Silenciosa e sem perspectiva de trégua. Dragões silenciosos travam batalhas, conspirando e corrompendo corações. Com outros dragões. Que nos visitam. Que nos distanciam. Todos os dias. Todas as noites. Colocando tempero e calor a vidas insossas, no fastio das madrugadas sem fim. Sem a conivência de estrelas e inventários. Dragão, Paixão,  sabe-se lá o quê. O que empurra nossas vidas não está nos dicionários. A única furiosa certeza é que tem asas e fogo.

terça-feira, 15 de julho de 2014

inverno


mãos trêmulas ,
alecrim e lavanda.
perfume que
não é frio nem distância.
ajustado o foco
no olho direito,
na minha ignorância
do que é a vida,
do que é a cruzada
dividida
do saber e da espera.
por trás dos óculos a espera,
o foco ajustado no afeto
e no caminho
de cúmplices flores sem medo.

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Orides por ela mesma

“Reclamam, porque eu não falo de amor. Mas então não leram Homero... Eu quis chegar no miolo das coisas. Já fiz duas leituras para auditório de jovens e eles gostaram muito. Isso me deixa reconfortada. Mas, infelizmente, nossos especialistas ainda têm uma visão muito olímpica da poesia. (...) Mas é a velha história: é melhor que falem mal, mas falem de mim. Eu preciso de dinheiro para viver. Minha vida é um retrato da vida dos aposentados do Brasil. E a vida dos poetas no País. Eu queria ser mais enxuta, queria escrever poemas exemplares à moda de Brecht. Sei que não agrada, porque a moda hoje é o barroquismo. A moda é escrever como o Alexei Bueno. A moda é ser difícil. É um fenômeno sociológico e não adianta discutir com os fatos da sociologia. Não quero ir contra ninguém, só quero escrever meus poemas. (...) Eu sou pequena, pobre mulher que escreve uma poesia boa, mas, coitada, não é do meio. Não tenho família, não tenho bens, não freqüento os lugares chiques. É como se eu estivesse invadindo o Olimpo.”
 (Orides Fontela, in "Culture-se")

terça-feira, 17 de junho de 2014



quando estremeces
sou eu
quem terno tece
o temporal

sou seu sol
a gotejar
em tua fresta,
testemunha,
teu dorso
de arco e lira
em qualquer tempo,
tempestade

quando estremeces,
nas minhas mãos,
é só uma colheita
correndo sob meus pés.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

do-jô

ouço a leveza do golpe

osoto-gari

olhos montados,
 sangue minando lento,
como deve ser.
estudo possibilidades,
pontos de apoio.
uma alavanca
e eu mudo o mundo de lugar.
um olho na boca
e outro dentro do  olho.
no rosto pergaminho,
hálito doce de ventania.

poderia ser uma batalha,
um duelo,
uma morte passional.
mas é só o início de tudo.
a raiz,
a raiz de um dente.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

A dor o acompanhava há 2 anos. Um adenocarcinoma levou metade do seu rosto. A outra metade doía. Até ontem. Não sei se são meus dedos  ou se tudo já estava escrito. Só sei que eu estava lá. Bastava só que ele viesse.

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Há tempos não despertava assim. Num pulo. De quando ficava prendendo a respiração dentro d’água e emergia desesperado. O sonho era recorrente na infância. Depois de velho era novidade. Passarelas estreitas no céu, entrelaçadas, mistura da febre de sarampo com alucinações de vinho. Passarelas entrelaçadas. Assustadoras.