sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

censo

no planeta,
neste exato momento,
milhões de pessoas
procuram asas
quando lhes falta
o chão...

domingo, 20 de novembro de 2011

paixão: cena 2 tomada 9

[num quarto qualquer
num espaço qualquer
silêncio]

mergulho
- de novo -
em teus olhos

pássaros em revoada
ventosas
tentáculos
espáduas em arco
nervosa boca
de afiada lâmina

a desenhar
em minhas costas
a cartografia
do teu desejo

embriago-me
na tua boca nervosa
traduzida
em noites insones
lençóis frios
de saudade

resta
o castigo
do sal cortante
de teus flancos
em ressaca

roupas
do avesso
em vigília

tribunal de excessos

diapasão
de copos
e corpos esquecidos

dentro dentro dentro

nós em novelo
labirinto sem fio

somente
tuas pernas
ponteiros
de bússola nervosa
esperando norte
esperando a fúria
da manhã seguinte

não há vertigem
que pague
nosso amor de sempre.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

abismo

lanço meu corpo
em sangue,
em saudade,
em notas frias de rodapé.
ao vazio,
ao escuro,
ao vácuo
nebuloso
da saudade.
e a morte,
sem recado,
antes da queda,
quer ainda torturar
com espinhos,
com lembranças,
com a faca seca
de um adeus.

lanço meu corpo,
na vertigem
do teu corpo,
da tua história,
do destino
encapsulado
e frio
de nós dois.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

GPS

GPS pra quê?
se a gente
quer mais
é se perder na vida!

felizes são

andorinhas
abelhas
borboletas

instinto
arquitetura
liberdade

sábado, 27 de agosto de 2011

um bom vinho

é aquele que te traz inspiração até para escrever versos, é aquele que não estoura seu orçamento, e principalmente, que você não se arrependa no dia seguinte... como em quase tudo na vida o vinho a
gente acerta experimentando... mas na dúvida, os chilenos Casillero del Diablo, Santa Carolina e Luis
Felipe Edwards e Concha y Toro Reservado; os portugueses Periquita e Montado e o brasileiro Miolo Seleção são ótimas pedidas. encontrados em grandes hipermercados, são opções boas e acessíveis.

Sísifo

no espelho,
milímetros
de barba
por fazer

lenta
é a volta
do ponteiro
menor

um giro
sobre
si mesmo
orbital
é a fuga
do pensamento
em você

dentro de casa
automóveis
de casca
em casca
brotamos
silenciosamente

de quando
em quando
nossos corpos
e almas
se encontram

num piscar
de olhos
numa barba
por fazer
numa volta
do ponteiro
a órbita
interminável

dos cometas

e de nossa fúria
em pedra
ar e fogo

no espelho...

sábado, 13 de agosto de 2011

pai

na foto
na memória
no espelho

na voz
na ausência
na sombra

no naufrágio
no barco
na terra firme

na lágrima
no suspiro
na paixão

na foto
na memória
no espelho

domingo, 7 de agosto de 2011

espelhos

músculos fatigados,
retinas em fuga,
um tremor, um sismo,
e o silêncio...

onde começa você
e onde eu termino
dentro da moldura?

em castelos, tendas,
derretem-se corpos,
na alquímica ilusão,
do nosso amor
em fúria.

domingo, 3 de julho de 2011

luto

luto

contra o destino
contra o real
contra o desatino
contra o surreal

luto

é virar-se
do avesso
expor as entranhas
chorar
aos cântaros

luto

é uma luta vã
sem vencidos
sem perdedores

luto

é negro
como o abismo
do que não foi
do que não veio

luto

sempre
em busca de absolvição
das muitas faltas
de todo querer
inalcansável

luto

é triste
como uma morte lenta

pois dos crimes de paixão
não há culpados
somente vítimas

silenciosas

sábado, 18 de junho de 2011

paixão, lado B, faixa 3

pra tropeçar no caminho
um sapato maior

pra esquecer uma paixão
uma paixão maior

pra reparar uma ferida
uma ferida maior

pra aliviar uma perda
uma perda maior

pra espantar um silêncio
um silêncio maior

pra expiar um pecado
um pecado maior

pra toda dor e sofrimento
o destino
é dos males o menor

quinta-feira, 19 de maio de 2011

palavras são navalhas
no escuro a esmo
jogadas ao vento
o estrago é o mesmo

quinta-feira, 5 de maio de 2011

paixão, lado B, faixa 2

a paixão
não tem medida
onde começa?
onde termina?

trovoada repentina
choro no cinema
tombo inesperado
crise hipertensiva
roupas pelo chão
unhas roídas de ciúme
fome de madrugada

sem previsão do tempo
rascunho
manual

virose silenciosa

sem endereço
nem preço
nem destino

a paixão consome
os que ainda respiram
a brisa vertiginosa
da saudade.

domingo, 17 de abril de 2011

expertise

lembro teu corpo

antes

de um tempo

que não havia

cabelos brancos

nem brancos na memória.


lembro teu perfume

antes de uma luz

que não existia

o escuro da morte

nem norte

em que se agarrar.


lembro teu prazer

antes do espelho

que não refletia

corpos agonizantes

nem a tirania

de viver em plena fúria.


(08/05/2010)

domingo, 3 de abril de 2011

Teia (Orides Fontela)

A teia, não

mágica

mas arma, armadilha


a teia, não

morta

mas sensitiva, vivente


a teia, não

arte

mas trabalho, tensa


a teia, não

virgem

mas intensamente

prenhe:


no

centro

a aranha espera.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

brainstorm

contemplado abismo, adiantado tempo da queda, na palma da mão, por entre dedos - o silêncio - inebriado em rasgada bruma, perdido em tempo certo, distraído; a luz do teu rosto, o sabor da tua voz, - metamorfose - gelado vento em castigado rosto. nalgum lugar, esquecido, remontado cristal partido, que um dia num gemido, refletia nós dois. contemplado abismo...

sábado, 5 de março de 2011

sacrifício

esfacelo meu corpo
a saciar tua noite
teu desafiador encanto
de serpente.

em viva carne
invado
teu santuário
de tremores
e desespero.

sempre é último
o sacrifício
a enovelar o destino
solitário de teus olhos
de teus grandes e escuros olhos.
em que mergulho
sem pressa...
sem volta...

repousas meu corpo
em teu altar
de vertigem e trégua,
sem sangue
nem arrependimento.

sempre é último
o mergulho,
enovelado em teus olhos
teus grandes e escuros olhos.
em que me sacrifico
solitário.
sem pressa...
sem volta...

domingo, 13 de fevereiro de 2011

álgebra

paixão.
matemática pura.
equação com duas incógnitas:
eu e você.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Wall of Silence - October Project (Muro do Silêncio)

"o homem com a flor na boca"

o que é que só duas vezes na vida floresce,
que é metade infância,
que é metade distância?

que às vezes contida,
jorra da alma o perfume
que nomearam sorriso?

que arrancada sem capricho,
povoa os telhados
as latas de lixo?

que transformada
em ouro e porcelana,
reabilita, disfarça, engana?

que dá vida aos jardins
de acrílico indolor?

tão linda esta flor
que tenhos nas mãos,
regadas com lágrimas
e silêncio...

sambinha despretensioso

vibra no bolso uma saudade
recado no computador
não há GPS que te encontre
nem menu que espante essa dor

mando sinais de fumaça
SOS em pleno mar
mando bilhetes na garrafa
torpedos no celular

na cidade que me engole
vou na saudade respirar
na memória do teu cheiro
solidão vai me matar

mando sinais de fumaça
SOS em pleno mar
mando bilhetes na garrafa
torpedos no celular

vibra no bolso uma vontade...

sábado, 5 de fevereiro de 2011

solidão

o vinho decanta

séculos

rubis pérolas medalhões

pilhagem noturna

sob os pés da vindima.



náufrago,

ébrio

esperança de tormenta

no peito aberto

de arpões e sangue fresco



não há nau

que escape do desatino

destino

macerado

entre os teus dedos

entre teus seios



embriagadamente

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

inventário II

lembranças -
esvaziando bolsos,
bolsas,
escaninhos -
redemoinhos ...

lembranças -
trôpegas,
respirando
com a ajuda
de aparelhos -
de estiagem,
de espinho ...

lembrança -
glacial,
estopim
sem centelha -
paralisada
numa folha seca
e vermelha.

domingo, 23 de janeiro de 2011

os animais carnívoros (fragmento) Herberto Helder/1968

Havia uma cidade em espanto linear a cavalo noutra cidade em geometria ambígua, um jardim era metade de outro, em que as pétalas andavam para trás e para diante, com o perfume trocado e o silêncio das cores tremendo no seu erro cheio de alvoroço florido, e os arquitectos disseram: é preciso um novo espaço para estas duas pessoas que estão a pensar tanto com o corpo - e numa casa abria-se a porta que vigiava os corredores onde o pólen se acendia e dançava, e de repente a porta descerrava o espectáculo antigo do nascimento da lua num quarto escuro, e via-se o que a lua sempre fez para trepar do soalho para o tecto pelas paredes docemente retardadas, era o tempo da seda entre os nossos vinte dedos embrulhados, e alguém escrevia à máquina num dos planos da intersecção urbana, e a frase escrita aparecia com o seu rumor externo noutro sítio, mas agora via-se no meio dela uma clareira de silêncio vivo, e ia-se aprendendo a nossa mútua nudez colocada no sentido da frase, nós éramos essa cidade tremendamente posta em uso, em toda a parte estavam mãos em vez de garfos e lâmpadas, e a frase era assim: o amor, as mãos ininterruptas.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

mergulho em teus olhos

mergulho em seus olhos,
como se última fosse a paisagem
pálpebras coreográficas
desmontados
em suor e lágrimas,
apontando o caminho da luz
e do sonho.

mergulho em teus olhos,
como se última fosse a mulher,
astrolábios,
língua a circular mamilos
rota de vergões a desenhar
tragédias
em minhas costas.

mergulho em teus olhos,
na tua fúria
de procura inominada,
que arrebenta nas pedras,
na praia,
no silêncio...

no silêncio gostoso do silêncio.

domingo, 2 de janeiro de 2011

ressaca

trôpego,
junto nossos pedaços
sob móveis,
garrafas vazias,
espantadas peças de roupa.

catalogo
cheiros,
beijos, gemidos,
todas sorte
de álibis
e de sentidos.
"onde é que nós estamos que não reconhecemos nem os desconhecidos" (Paulo Leminski)